Técnica polêmica ‘ressuscita’ lobo-terrível, extinto há mais de 10 mil anos
Empresa americana Colossal Biosciences revela a criação de filhotes de lobo-terrível, espécie que desapareceu das Américas há milênios, utilizando edição genética avançada

A empresa americana Colossal Biosciences anunciou na
segunda-feira (7/04) a criação de filhotes de lobo-terrível (Aenocyon dirus),
uma espécie extinta há mais de 10 mil anos. Em um vídeo compartilhado nas redes
sociais, é possível ouvir os uivos dos filhotes, que teriam sido gerados através
de uma técnica avançada de edição genética.
Segundo a Colossal Biosciences, essa é uma das primeiras
tentativas de trazer uma espécie extinta de volta à vida, uma prática conhecida
como "deextinção". O projeto também visa a reintrodução de outras espécies,
como o mamute-lanoso (Mammuthus primigenius), o dodô (Raphus cucullatus) e o
lobo-da-tasmânia (Thylacinus cynocephalus). Mas, como exatamente a empresa
conseguiu realizar esse feito? E quais são as implicações e controvérsias desse
tipo de pesquisa? A seguir, explicamos como a Colossal Biosciences
"ressuscitou" o lobo-terrível.
Como foi feito?
O primeiro passo do projeto foi a coleta de amostras de DNA
do lobo-terrível, extraídas de um dente de 13 mil anos encontrado em Ohio e de
um pedaço de crânio com 72 mil anos escavado em Idaho, ambos nos Estados
Unidos. O material genético foi sequenciado, permitindo aos cientistas comparar
os genes da espécie extinta com os de espécies vivas.
Eles descobriram que o lobo-terrível estava geneticamente
mais próximo do lobo-cinzento (Canis lupus), que ainda vive em regiões frias do
Hemisfério Norte, como Canadá e Rússia. Usando essa informação, os cientistas
realizaram modificações no DNA do lobo-cinzento, alterando 14 genes em 20
locais específicos para aproximá-los das características genéticas do
lobo-terrível. Essas mudanças incluíram a cor do pelo, o porte maior, a
musculatura das pernas e a forma da cabeça e orelhas.
Após a edição genética, o núcleo de uma célula de
lobo-cinzento foi transferido para um óvulo, o qual foi cultivado até se tornar
um embrião. Esse embrião foi então implantado no útero de uma cadela doméstica,
que deu à luz os filhotes em 2024 e 2025. Os dois primeiros filhotes, nascidos
em 1º de outubro de 2024, foram batizados de Rômulo e Remo, e o terceiro
filhote, Khaleesi, nasceu em janeiro deste ano.
O Futuro dos Lobos-Terríveis
Atualmente, Rômulo, Remo e Khaleesi vivem em uma reserva
privada nos Estados Unidos, cuja localização não foi divulgada por questões de
segurança. Não há planos de liberar os animais na natureza, e a possibilidade
de eles gerarem uma nova geração de lobos ainda não foi discutida.
Implicações e Controvérsias
A Colossal Biosciences defende que o objetivo da deextinção
é utilizar a edição genética para combater a perda de biodiversidade causada
pelas mudanças climáticas e pela ação humana. A empresa argumenta que a
reintrodução de espécies extintas, como o lobo-terrível, poderia ajudar a
restaurar o equilíbrio ecológico, já que esses predadores têm um papel crucial
na regulação das populações de outras espécies.
No entanto, a prática levanta questões sobre sua viabilidade
e os efeitos ambientais. Muitos cientistas, como o paleogeneticista Nic
Rawlence, da Universidade de Otago, argumentam que o lobo-terrível não pode ser
considerado uma "ressurreição" real, já que ele foi alterado
geneticamente, sendo mais um híbrido do lobo-cinzento do que uma réplica exata
da espécie extinta. Rawlence destaca que a divergência genética entre o
lobo-terrível e o lobo-cinzento ocorreu há milhões de anos, tornando a
reintrodução prática da espécie questionável, especialmente devido às
diferenças genéticas significativas.
Além disso, é incerto como esses animais se adaptariam a um
ambiente moderno, considerando que eles não têm um ecossistema natural que
suporte uma população de lobos-terríveis, que costumavam viver em grandes
bandos e necessitavam de vastos territórios.
O Debate sobre a "Deextinção"
A abordagem da Colossal Biosciences tem gerado debates sobre
a ética e a terminologia usada para descrever o projeto. Embora a empresa
argumente que está "ressuscitando" o lobo-terrível, muitos
especialistas preferem ver os animais como uma versão modificada do
lobo-cinzento, ao invés de uma recriação fiel da espécie extinta.
Beth Shapiro, uma das cientistas envolvidas no projeto,
defende que os conceitos de espécie são humanos e que, se os animais se
assemelham ao lobo-terrível, podem ser considerados como tal, apesar das
modificações genéticas. No entanto, críticos como Rawlence apontam que, ao fazer
apenas 20 edições em 14 genes, a empresa não conseguiu trazer de volta a
verdadeira "essência" do lobo-terrível.
A polêmica em torno da "deextinção" do
lobo-terrível continua a dividir a opinião pública e a comunidade científica,
deixando em aberto as questões sobre os limites e as responsabilidades da
biotecnologia.
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