Polícia investiga esquema entre facção e empresa que atende cantinas de prisões do RS
Suspeita de lavagem de dinheiro envolve esquema que usa refeitórios de presídios para traficar recursos ilícitos. Facção foi alvo de operação nesta terça-feira

A investigação que culminou na Operação Porta Fechada, deflagrada pela Polícia Civil na manhã desta terça-feira (18/03) em quatro estados, revelou um possível esquema de lavagem de dinheiro envolvendo uma facção criminosa do Vale do Sinos e uma empresa que abastece cantinas em presídios gaúchos. As informações são da Zero Hora.
De acordo com a delegada Ana Flávia Leite, do Departamento Estadual de Investigações do Narcotráfico (Denarc), a organização criminosa estaria usando as cantinas de presídios para lavar dinheiro.
— Essa empresa gerencia a maior parte das cantinas do estado e é envolvida em um esquema complexo que já perdura há anos, utilizando as contas para legitimar o dinheiro do tráfico — explicou a delegada à Zero Hora.
Embora a Polícia Civil não tenha revelado o nome da empresa investigada, fontes confirmaram à Zero Hora que a empresa em questão é a Mais Sabor Alimentos Ltda., com sede em Charqueadas, na Região Carbonífera. A reportagem está tentando contatar a defesa dos envolvidos.
Durante o cumprimento de mandados, em uma das sedes da
empresa, em Novo Hamburgo, a polícia apreendeu R$ 58 mil em espécie e
uma pistola 9mm. Uma mulher, sócia da empresa, foi presa na ofensiva.
Esquema de "mescla"
A investigação aponta que o esquema utilizaria o chamado "mescla", prática que envolve a mistura de dinheiro lícito, proveniente da venda de produtos nas cantinas prisionais, com dinheiro ilícito, oriundo de tráfico de drogas ou extorsões. A empresa investigada estaria entre os alvos da operação, com membros da organização criminosa também identificados.
O esquema seria restrito a uma única facção com origem no Vale do Sinos, embora atualmente a organização tenha presença em todo o estado. Durante a investigação, a polícia identificou depósitos que seriam usados para ocultar o dinheiro ilegal proveniente dessas atividades criminosas.
Golpes e lavagem de dinheiro
A polícia revelou que integrantes da facção aplicavam diversos golpes e extorsões, com o objetivo de retirar dinheiro das vítimas. Esses valores eram então transferidos para “laranjas” — intermediários — para disfarçar a origem ilícita do dinheiro e dificultar o rastreamento. Uma parte desse dinheiro era enviada via Pix para a empresa de cantinas.
Além disso, os valores arrecadados com esses golpes eram direcionados para contas bancárias associadas à empresa, sendo utilizados disfarçadamente para pagar mercadorias adquiridas para as cantinas dos presídios. As investigações apontam movimentações financeiras suspeitas nas contas da empresa, com transações que somaram cerca de R$ 32 milhões em menos de 10 meses.
A empresa, que firma contratos individuais com o Estado para a comercialização de produtos alimentícios nas prisões, tem renovado contratos desde 2019. A Polícia Civil está investigando se esses contratos facilitaram o funcionamento do esquema.
Facilidade de entrada de armas e drogas
A investigação também levantou suspeitas de que a empresa estivesse envolvida no transporte de armas e drogas para os presídios, usando as mercadorias alimentícias como fachada. Em 2021, foram encontradas cocaína e maconha dentro de potes de achocolatado destinados a unidades prisionais. Nesse mesmo ano, foi apreendido um revólver e entorpecentes em um dos caminhões que transportavam produtos para as cantinas.
Ação judicial e decisão na Serra
Em novembro de 2024, a Justiça determinou a suspensão do serviço e a abertura de investigação na cantina da Penitenciária Estadual de Caxias do Sul. A suspeita era de lavagem de dinheiro e de práticas que favoreciam a presença de organizações criminosas dentro do presídio. A empresa Mais Sabor Alimentos Ltda. era até então responsável pela operação da cantina.
A decisão judicial foi baseada em uma inspeção feita pela juíza Paula Moschen Brustolin Fagundes, que identificou discrepâncias nas quantidades de dinheiro que circulavam na penitenciária e a falta de registros fiscais para itens alimentícios que chegavam às cantinas. A juíza observou que as quantias que entravam através de visitas para os presídios eram muito menores do que as transações realizadas dentro da unidade.
Defesa da empresa
A reportagem de Zero Hora entrou em contato com a Secretaria da Segurança Pública e aguarda retorno. A defesa da Mais Sabor Alimentos Ltda. também foi procurada, e o advogado Pablo Laurindo Garcia Simas afirmou que se manifestará após o término da operação.
Em relação à decisão judicial de Caxias do Sul, o advogado afirmou, em novembro passado, que a empresa segue os contratos estabelecidos com a Superintendência de Serviços Penitenciários (Susepe) e que todas as mercadorias passam por um sistema de filtro realizado pelos agentes penitenciários para evitar irregularidades.
Polícia realiza operação contra facção envolvida em tráfico, agiotagem e extorsões
Nesta terça-feira (18/03), a Polícia Civil deflagrou uma grande operação em 23 municípios de quatro estados, com o objetivo de desarticular uma facção criminosa do Vale do Sinos, envolvida em tráfico de drogas, agiotagem, extorsões e outros crimes. Além do Rio Grande do Sul, as ordens judiciais estão sendo cumpridas em Santa Catarina, Paraná e Mato Grosso. Ao todo, são 41 mandados de prisão e 45 ordens de busca e apreensão, incluindo a apreensão de dois veículos. Até o início da manhã, 31 pessoas haviam sido presas.
A operação é resultado de investigações iniciadas em julho do ano passado, quando a polícia interceptou um furgão carregado com 400 quilos de maconha, que seria entregue em Sapucaia do Sul, na Região Metropolitana de Porto Alegre. A apreensão deu início a uma série de investigações que levaram ao rastreamento de outras pessoas envolvidas no esquema criminoso.
Investigações e ações da operação
Segundo o delegado Carlos Wendt, diretor do Departamento Estadual de Investigações do Narcotráfico (Denarc), a operação resultou na apreensão de armas e drogas, cujas quantidades ainda estão sendo contabilizadas. A delegada Ana Flávia Leite explicou que, além do tráfico, a organização também estava envolvida em extorsões e golpes para angariar recursos. Parte desses valores eram transferidos para contas de "laranjas", dificultando o rastreamento do dinheiro ilícito.
A operação, coordenada pela 2ª Delegacia de Repressão ao Narcotráfico, tem como principal objetivo desarticular essa facção criminosa, prender seus membros, apreender bens e valores, além de causar a descapitalização do grupo. O delegado Alencar Carraro, responsável pela coordenação da operação, destacou que a organização tinha um alto grau de especialização, envolvendo crimes como agiotagem, adulteração de sinal identificador de veículos, e outros delitos. Além disso, o grupo atuava não só no Rio Grande do Sul, mas também em outros estados.
Ações nos presídios
A investigação revelou que a facção mantinha uma estrutura de comando dentro dos presídios, de onde os líderes davam ordens aos colaboradores externos, responsáveis por gerenciar o tráfico de drogas e controlar a distribuição nos bairros. Outro ponto importante da investigação foi o vínculo entre o grupo criminoso e a empresa que administra cantinas em presídios do Estado, com contratos com o governo do Rio Grande do Sul.
Grandes apreensões
Além do tráfico de drogas, a organização também se envolvia no transporte de grandes quantidades de entorpecentes. Em junho de 2024, a Polícia Rodoviária Federal apreendeu uma carga de 5 toneladas de maconha, avaliada em cerca de R$ 10 milhões, que estava escondida no tanque de uma carreta. A carga tinha como destino a região metropolitana de Porto Alegre. O motorista e a passageira foram presos na ocasião.
A operação
A operação cumpre 24 mandados de prisão preventiva, 17 mandados de prisão temporária, 45 mandados de busca e apreensão e envolve 200 policiais. Os crimes investigados são organização criminosa, tráfico de drogas, associação para o tráfico, agiotagem, extorsão e adulteração de sinal identificador de veículos.
No Rio Grande do Sul, as ordens são cumpridas em Porto Alegre, Viamão, Guaíba, Canoas, Sapucaia do Sul, Esteio, Novo Hamburgo, São Leopoldo, Charqueadas, Lajeado, Cruzeiro do Sul, Capão da Canoa e Erechim. Fora do Rio Grande do Sul, mandados são cumpridos em Maringá e Sarandi (PR), Cuiabá (MT), Palhoça e Passo de Torres (SC).
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