EDITORIAL | ‘Ainda Estou Aqui’ e a memória que não pode se apagar
Filmes como Ainda Estou Aqui cumprem um papel essencial na preservação da verdade, impedindo que a amnésia histórica se imponha e garantindo que as novas gerações compreendam a necessidade da democracia e do respeito aos direitos humanos
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A vitória de Ainda Estou Aqui no Oscar 2025 representa muito mais do que um marco para o cinema brasileiro. O reconhecimento internacional da obra de Walter Salles, baseada na história de Eunice Paiva e na luta por justiça durante a ditadura militar, é um lembrete poderoso da importância da memória e da necessidade de se contar – e recontar – nossa história.
O Brasil ainda sofre com as cicatrizes de seu passado autoritário. Há quem tente reescrever os horrores do regime militar, minimizar os desaparecimentos forçados e a tortura institucionalizada, propagando uma visão distorcida do período. Filmes como Ainda Estou Aqui cumprem um papel essencial na preservação da verdade, impedindo que a amnésia histórica se imponha e garantindo que as novas gerações compreendam a necessidade da democracia e do respeito aos direitos humanos.
No entanto, a valorização do cinema nacional não pode se limitar à euforia de uma premiação internacional. O Brasil tem talentos e histórias que merecem espaço, mas enfrenta um cenário de dificuldades estruturais para a produção cultural. O recente desmonte de políticas de fomento, a falta de incentivos ao setor audiovisual e os constantes ataques à cultura precisam ser revertidos. A indústria do entretenimento não é apenas arte; é economia, geração de empregos e identidade nacional.
O mesmo princípio se aplica à educação. A ascensão das redes sociais, o avanço da desinformação e a disseminação de discursos anticientíficos mostram que a batalha pelo conhecimento nunca foi tão urgente. É preciso investir em formação crítica, para que a população consiga diferenciar fatos de versões distorcidas da realidade. Um país que negligencia a cultura e a educação se torna refém da ignorância e da manipulação.
Além disso, Ainda Estou Aqui chega em um momento em que o Brasil enfrenta um desafio político crucial. O país precisa se libertar da polarização que coloca a esquerda e a direita como inimigos irreconciliáveis. Esse embate permanente trava avanços e impede que questões essenciais – como a educação, a cultura, a economia e o combate à desigualdade – sejam tratadas com seriedade. O cinema nos ensina que histórias complexas não podem ser reduzidas a narrativas simplistas. O mesmo vale para a política.
O Oscar conquistado por Ainda Estou Aqui deve servir não apenas como motivo de orgulho, mas como ponto de reflexão. Que essa vitória nos inspire a investir mais em cultura, a lembrar do nosso passado sem filtros ideológicos, a combater as mentiras que ameaçam a democracia e a construir um Brasil onde o debate político se baseie em ideias e não em ataques. A história nos ensina, mas cabe a nós decidir se vamos aprender com ela.
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