STF forma maioria para autorizar que Testemunhas de Jeová recusem transfusão de sangue
Decisão prevê que SUS custeie tratamentos alternativos, quando disponíveis
O Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria, nesta quarta-feira (25/09), para autorizar que Testemunhas de Jeová possam recusar transfusões de sangue, se assim desejarem. Além disso, os ministros decidiram que o Estado deve custear tratamentos alternativos disponíveis, caso o paciente opte por essa alternativa.
As Testemunhas de Jeová, uma religião cristã, interpretam literalmente uma passagem bíblica que, segundo sua doutrina, ordena a abstenção de sangue. A decisão do STF reconhece esse dogma religioso, assegurando o direito de recusa à transfusão. Se o tratamento alternativo estiver disponível apenas em outra localidade, o transporte e a estadia do paciente poderão ser custeados pelo poder público. Até o momento, seis ministros votaram a favor dessa posição.
A corte analisa dois processos com repercussão geral, ou seja, as decisões terão impacto em todas as ações semelhantes no Judiciário brasileiro. Os casos estão sob a relatoria dos ministros Luís Roberto Barroso e Gilmar Mendes. Também votaram a favor os ministros Flávio Dino, Cristiano Zanin, André Mendonça e Kassio Nunes Marques.
Em seu voto, Barroso destacou que a liberdade religiosa está diretamente relacionada à dignidade humana, à autonomia individual e ao direito comunitário. Ele citou precedentes internacionais, incluindo uma decisão semelhante da Colômbia que permitiu a recusa à transfusão de sangue por razões religiosas.
— O Estado não pode ter religião oficial nem favorecer uma religião em detrimento de outra. Laicidade não significa oposição às religiões, mas sim assegurar que todas tenham o direito de se manifestar dentro da lei. Assim, no caso das Testemunhas de Jeová, considero legítima a recusa à transfusão de sangue — afirmou Barroso.
Ele ressaltou que a recusa ao tratamento deve obedecer a critérios específicos, como ser feita por um paciente maior de idade, com discernimento, de forma voluntária e sem coação.
Durante o julgamento, dois pontos foram amplamente discutidos. Um deles foi a situação de crianças e adolescentes, com Flávio Dino e Cristiano Zanin enfatizando que o julgamento deve se aplicar exclusivamente a adultos, que têm o direito de decidir por si mesmos.
Outro ponto de destaque foi a objeção de consciência dos médicos. Flávio Dino argumentou que os profissionais de saúde não podem ser obrigados a aplicar tratamentos alternativos, especialmente quando não há consenso científico sobre o protocolo. Zanin concordou, afirmando que os médicos têm o direito de recusar o procedimento se for contra suas convicções.
O julgamento teve início em 8 de agosto, quando o Supremo ouviu os argumentos das partes envolvidas e de associações ligadas ao tema.
No primeiro recurso, relatado por Barroso, uma mulher teve sua cirurgia de substituição de válvula aórtica negada pela Santa Casa de Maceió (AL) após se recusar a assinar um termo consentindo eventuais transfusões de sangue. Ela acionou a Justiça para exigir um tratamento alternativo.
No segundo caso, a União recorreu de uma decisão que a condenou, junto com o Estado do Amazonas e o município de Manaus, a arcar com os custos de uma cirurgia de artroplastia total. A paciente foi transferida para São Paulo, pois o procedimento sem transfusão de sangue não estava disponível no Amazonas.
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